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Da série “um dia mordo alguém no autocarro”

Esta manhã, uma sexagenária de cabelo vermelho pediu ao condutor para lhe indicar o número de telefone para os “passes perdidos”, pelo que o condutor se ergue para ajudá-la, interrompendo a marcha do bus por coisa de 30 segundos. Foi o suficiente para uma dupla de meia-idade se insurgir, no banco atrás de mim, nos seguintes modos: «Uma pessoa a ter que ir trabalhar e só vêm empatar» / «É como aquelas pessoas que deixam os aquecedores ligados o tempo todo e depois dizem que o dinheiro não chega» / «E os professores que vão para a rua fazer manifestações com os cartazes, que exemplo é que dão aos alunos?». E é por isso que um dia mordo alguém no autocarro.

Nota: estávamos a estudar na piscina.

Fotos cedidas pelos colegas de sela. Sela dos cowboys, pois claro :)

Vista da janela do quarto: estádio dos Texas Longhorns. "Hook 'em horns".

Um dos três arranha-céus de Austin, mais o seu lago.

O tal 'tour bus' que virou barco e entrou pelo lago adentro.

Zona de estudo.


Zona de estudo a valer: a residência.

Oh pequenito! Queres uma batatinha frita?

A 'night'

Sair à noite em Austin é como entrar numa fábrica de pot, e não estou a falar de olaria. Além de ser a capital da música ao vivo, Austin detém concerteza um epíteto para o maior número de janados numa área não superior a cinco quarteirões. Isso também vale para o número de tatuados, de west-side-east-side-representing-yo de colar brilhante ao peito, e de hippies fofinhos, porém eternamente necessitados de um banho. Bares, há-os normais, a lembrar a "cena" de Albufeira; há os tais de música ao vivo; e há os etnográficos, como o 'Mi Casa' para os latinos; o 'Shakespeare' para os betinhos; e o 'Nigga' (nome verdadeiro por apurar) para a malta dos props, cujo DJ vai animando o 'people' com a sua mão ondulante e o seu portentoso rabo virado para a vitrine, abanando uma bacia do tamanho do Mediterrâneo. Nota especial para os adereços: mini-saias e vestidos colados ao corpo, por vezes avantajado, de espécimes caucasianos predominantemente loiros, latinos ou negros, que se roçam em jovens potes de testosterona. O melhor da noite: o bar Coyote Ugly. Sim, é tudo o que o filme aclamava, e em cima do balcão, mas em feioso.

Sexygenária

Estou parada na avenida principal de Austin, à procura de uma loja que venda adaptadores de corrente, quando uma sexagenária me aborda, mais o seu cigarro pendente do canto da boca: "Do you know where the lingerie shop is?". Engulo em seco, o tom é agressivo. "No, m'am, I am not from around here". Ela continua impaciente e solta o bicho da caverna: "Where you from? This place sucks. The whole United States suck. This is shit". Pois, mas eu só estou de visita. "From Portugal? I've been in Portugal. I was a stewardess. This place sucks. Do you know where the lingerie shop is?".

Barton Springs forever (quais Strawberry Fields)

Três tugas ouvem falar de uma piscina natural em Austin, um tipo de riacho do Rio Colorado puxado pela barragem, com relvinha à volta e famílias a banhos. Três tugas metem-se no autocarro e logo um jovem de óleo fula no cabelo mete conversa com eles, oferecendo-se para levá-los à zona grátis de Barton Springs. O autocarro vai enchendo e percebemos que a alternativa a poupar 3 dólares de entrada na piscina natural é ficarmos sem roupa ao primeiro mergulho. Recusamos a oferta gentilmente, não sem antes sermos convidados para o aniversário do jovem na sexta-feira seguinte - primeiro na dita piscina, e depois na casa de um amigo. Não por sermos especiais, mas porque a sua missão, naquela tarde, era distribuir flyers para a sua festa de aniversário. Quem aparecer com um panfleto na mão, não precisa de levar bebida.

Campus, com u

Vida de campus é proveitosa na UTexas. Há tempo para ler os livros de cinematografia, imagem e som; para esmiuçar as multi-funções dos produtores; para ler os guiões de 100 e muitas páginas de filmes inspiradores; para contar as escamas dos carapaus e os picos dos porcos-espinhos. Esta última parte só porque é Domingo e já acabei os TPC.
Helas: professores exigentes, aulas estimulantes e colegas interessantes. A San Jacinto Residence Hall é uma de muitas residências neste campus com (glup) 140 hectares. Além das faculdades, temos um dos maiores museus de cinema de sempre (Harry Ransom Center), um ginásio a fazer inveja a muitos holmes places com três piscinas exteriores, e uns vizinhos muito castiços: esquilos e guaxinins. Se disserem que estive a dar-lhes batatas fritas, nego tudo.

Y'all wanna know Austin?

O blog ressuscitou. A partir de hoje, crónicas do Texas.
Poderá parecer que só vou falar do, ermmm, mau. Chamemos-lhe insólito. For real, Austin is the coolest place in Texas. Só não boto fotos ainda porque, feita tola, deixei a máquina em casa. Mas, brevemente, chegarão as fotos dos 10 colegas tugas que me acompanham nesta aventura texana :)

A vida é feita de pequenos nadas, diz o Sérgio Godinho

E geralmente também não damos nada por eles. Vêm tão disfarçados na rotina que mal prestamos atenção às suas formas. Excepto, talvez, quando engolimos a rotina e vamos de férias. Foi por isso que tropecei neste pequeno nada: uma embalagem de Trident, comprada na Escócia, que acrescentava à morada da empresa: “Please write us if you’re feeling lonely”. Nessa mesma viagem pela terra dos kilts, assoei-me a uns lenços Renova que tinham a seguinte mensagem no pacotinho: “Made with smiles in EU”. Assim dá gosto ser (um tudo ou nada) ranhosa. :D

A vida real

Ontem à noite, numa respeitada pastelaria de Benfica, um senhor embriagado defendia o título de “o último comunista em Portugal” (o Avante provará o contrário), lançando para o ar impropérios de nível 10 – só porque sim. Eis que entra um jovem bem-parecido e arrumadinho, para perguntar qualquer coisa ao empregado, e grita-lhe o camarada: “Ó, tu aí, não dás uma queca há duas semanas”. :D

Pouca Terra-a-terra

Não consegue decidir se o melhor momento da sua mais recente viagem de comboio foi:

a) O barbudo com pinta de intelectual de esquerda que pôs a tocar, a partir do seu portátil, bossanova (daquela xoninhas) para a malta da carruagem. Um bem-haja pela depressão colectiva.
b) A jovem que mascava pastilha elástica com a boca aberta – tão aberta que chegava a ser pornográfico.
c) A pequena “chuckie” de 2 anos, autora d’A Birra do Século. Não bastava ter gritado e esperneado com a mãe, sentada no chão da carruagem. Quando recuperou forças, depois de ter estado no meu colo a ler um livro, a pequena roubou-me uma caneta, com a qual riscou a contracapa do meu livro e, quando lhe disseram “já chega”, ainda rasgou uma revista, só para mostrar quem manda. :D